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Aerolevantamento com Varredura a Laser: novas fronteiras para o planejamento territorial no Rio Grande do Sul

Felipe Guadagnin

Resumo

O avanço das tecnologias de aerolevantamento e de sensoriamento remoto tem transformado significativamente as práticas de mapeamento, monitoramento e planejamento territorial no Brasil. No Rio Grande do Sul, projetos recentes de aquisição de Modelos Digitais de Terreno (MDT) e Modelos Digitais de Superfície (MDS) a partir de levantamentos LiDAR vêm ampliando as bases de dados geoespaciais disponíveis para aplicações em engenharia, geologia, meio ambiente e defesa civil. Este artigo apresenta os princípios técnicos do aerolevantamento LiDAR, discute suas aplicações e destaca os benefícios e os desafios associados à sua implementação no contexto gaúcho.

 

1. Introdução

O aerolevantamento é, segundo o Ministério da Defesa, “Serviço Aéreo Público Especializado - SAE-AL, cabendo ao Estado o controle dessa atividade visando promover o desenvolvimento nacional, mediante a proteção de áreas estratégicas específicas do seu território” (Portaria 3703, de 06 de setembro de 2021, do Ministério da Defesa).

O aerolevantamento abrange as fases aeroespacial e decorrente, sendo a fase aeroespacial a da aquisição de dados por meio de sensores instalados em qualquer plataforma aérea ou espacial e a fase decorrente, o processamento, tratamento, interpretação, produção ou distribuição dos produtos gerados.

A fase aeroespacial pode ser realizada por meio das operações de (i) aeroprospecção, que incluem o uso de sensores geofísicos; (ii) aerofotogrametria e afins, que visam obter medições geométricas planimétricas ou altimétricas acuradas da superfície terrestre; ou (iii) captação e registro de dados nas Estações Receptoras de Dados Orbitais.

A operação de aerofotogrametria e afins inclui o uso de sensores fotográficos, radares ou de varredura a laser. Este último está incluído entre as técnicas de sensoriamento remoto ativo; o sensor emite e recebe o retorno de pulsos de laser, produzindo nuvens de pontos 3D. A varredura a laser é conhecida internacionalmente pelo acrônimo LiDAR, de Light Detection and Ranging. O LiDAR pode ser utilizado em aeronaves tripuladas ou remotamente pilotadas (RPAS – Remotely Piloted Aerial System), como os populares drones.

 

Com a redução do custo dos equipamentos e o aprimoramento dos sistemas de processamento de dados, incluindo hardware e software, os sensores LiDAR embarcados em RPAS têm se popularizado e vêm sendo gradualmente aplicados à geração de Modelos Digitais de Elevação – Modelos Digitais de Superfície e Modelos Digitais do Terreno, com aplicações em diversas áreas das Engenharias.

Os levantamentos topográficos planialtimétricos têm se beneficiado do uso de LiDAR por dois motivos principais: o primeiro, pela capacidade da aeronave de abranger dezenas a centenas de hectares em um único sobrevoo; e o segundo, pela possibilidade do feixe de laser captar pontos no terreno mesmo em áreas com vegetação densa. Essas vantagens têm favorecido o aerolevantamento por LiDAR em grandes áreas, muitas vezes de difícil acesso e com vegetação densa, em relação aos métodos de levantamento planialtimétricos convencionais, com GNSS ou Estação Total. Na figura 1 está ilustrado um exemplo de aerolevantamento com LiDAR realizado em área rural, contendo vegetação nativa, florestas plantadas, campo nativo, estradas e construções, onde foram gerados dois produtos, o Modelo Digital de Superfície (Fig. 1a) e o Modelo Digital do Terreno (Fig. 1b).

Figura 1: Exemplo de aerolevantamento com LiDAR de área rural, onde foi gerado o Modelo Digital de Superfície (a) e o Modelo Digital do Terreno (b).

No âmbito das geociências e da engenharia, essa técnica tem se consolidado como uma ferramenta essencial para o planejamento urbano e rural, o gerenciamento de recursos naturais e a prevenção de desastres.

Nos últimos anos, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul e diversas instituições públicas e privadas têm investido em campanhas de aerolevantamento com tecnologia LiDAR, capazes de gerar modelos tridimensionais de alta precisão.

 

2. Fundamentos do mapeamento LiDAR

O sistema LiDAR baseia-se na emissão e recepção de pulsos de laser, que, ao refletirem na superfície terrestre, permitem calcular distâncias com elevada precisão. A integração desses dados com sistemas GNSS e unidades inerciais (IMU) permite determinar a posição e a altitude de cada ponto refletido.

Os produtos derivados do processamento LiDAR incluem:

a) Modelo Digital de Superfície (MDS): representa o relevo incluindo edificações e vegetação;

b) Modelo Digital de Terreno (MDT): obtido após a filtragem dos retornos correspondentes ao solo;

c) Nuvem de pontos classificada: base para aplicações tridimensionais e para integração com imagens fotogramétricas.

 

A densidade e a acurácia desses dados permitem análises detalhadas em escalas variando de 1:500 a 1:10.000, adequadas para planejamento urbano, infraestrutura viária, estudos geotécnicos e mapeamento de áreas de risco.

 

3. Aplicações no contexto gaúcho

O Rio Grande do Sul apresenta grande diversidade fisiográfica e socioeconômica, o que demanda bases cartográficas de alta resolução para subsidiar políticas públicas e projetos de engenharia. Entre as principais aplicações do aerolevantamento LiDAR no estado destacam-se:

· Planejamento urbano e cadastro técnico multifinalitário: mapeamento preciso de edificações e redes de drenagem em áreas urbanas;

· Gestão ambiental: modelagem de bacias hidrográficas, monitoramento de desmatamento e recuperação de áreas degradadas;

· Infraestrutura e transporte: estudos de traçado para rodovias, ferrovias e linhas de transmissão;

· Gestão de riscos e defesa civil: identificação de áreas suscetíveis a movimentos de massa e inundações;

· Geologia e mineração: modelagem 3D de afloramentos e controle volumétrico em minas e pedreiras.

 

Em 2025, o Projeto 0069/2025 do Governo do Estado do Rio Grande do Sul marcou um avanço significativo ao contratar o levantamento LiDAR de extensas áreas do território estadual, visando gerar MDTs e MDS de alta qualidade para subsidiar ações de planejamento territorial e de prevenção de desastres. Essa iniciativa, conduzida pela Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) e pelo Cemaden-RS, cria condições para o desenvolvimento de uma cartografia moderna e integrada.

 

4. Benefícios e desafios

Entre os benefícios diretos da adoção do LiDAR, destacam-se a alta acurácia altimétrica (acima de 10 cm), a capacidade de penetrar dosséis vegetais densos e a eficiência temporal na aquisição de dados. Além disso, a integração entre LiDAR e imagens fotogramétricas multiespectrais tem permitido análises tridimensionais com grande riqueza de detalhes, fundamentais para estudos ambientais e urbanos.

No entanto, persistem desafios importantes, como o alto custo inicial das campanhas de aerolevantamento, a necessidade de profissionais capacitados para o processamento e interpretação dos dados e a padronização dos formatos e metadados em bancos públicos. A consolidação de uma Infraestrutura de Dados Espaciais (IDE-RS) é essencial para maximizar o uso desses produtos em diferentes esferas do governo e da iniciativa privada.

 

5. Perspectivas futuras

Com a crescente disponibilidade de plataformas de baixo custo, como drones equipados com sensores LiDAR compactos, abre-se um novo horizonte para levantamentos em escala local. A combinação de aerolevantamento com inteligência artificial e modelagem preditiva tende a revolucionar o monitoramento do uso e da cobertura da terra, bem como o planejamento de obras de engenharia.

No contexto do Rio Grande do Sul, espera-se que a continuidade de programas de mapeamento sistemático fortaleça a governança territorial e o desenvolvimento sustentável, alinhando o estado às melhores práticas internacionais em geotecnologia.

 

6. Conclusão

O aerolevantamento LiDAR representa um marco na modernização da cartografia e do planejamento territorial no Rio Grande do Sul. A precisão e a riqueza de detalhes obtidas por essa tecnologia permitem fundamentar decisões estratégicas em engenharia, meio ambiente e gestão de riscos. Consolidar políticas públicas de acesso aberto a esses dados e capacitar profissionais em geotecnologias são passos essenciais para transformar informação espacial em conhecimento aplicado ao desenvolvimento regional.

 

Palavras-chave: aerolevantamento, LiDAR, mapeamento tridimensional, geotecnologias, Rio Grande do Sul.

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