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Novas DCNs: o que a Sociedade pode Esperar dos Novos Engenheiros?


Dr. Luciano Andreatta Carvalho da Costa

Eng. Civil, Professor adjunto da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs) e Fundação Liberato (FTEC)


Dr. Márcio Wrague Moura

Eng. Civil, Professor da Furg/Escola de Engenharia

 

Após um amplo debate no meio acadêmico e profissional da Engenharia, foram formuladas as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para cursos de Graduação em Engenharia (DCNs), ampliando as diretrizes vigentes até então e consolidando uma nova concepção para a formação do Engenheiro. Talvez o grande diferencial deste novo documento tenha sido a formação baseada em competências.


Além disso, valoriza a aprendizagem ativa, o que leva à possibilidade de uma maior flexibilização dos currículos. Mas o que efetivamente a sociedade pode esperar deste novo Engenheiro, formado a partir da concepção presente nas novas DCNs? Que implicações essas diretrizes terão para o efetivo exercício profissional desses Engenheiros, nas indústrias, universidades, organizações sociais, órgãos públicos e diversos setores em que atuam?

Foto ilustrativa

As diretrizes presentes na Resolução CNE/CES 11, de 11 de março de 2002, já traziam uma nova concepção para a formação do Engenheiro em comparação a documentos anteriores, valorizando uma formação mais humanista e engajada socialmente, bem como o espírito crítico do profissional de engenharia.


As novas DCNs, aprovadas em 2019, potencializam esta concepção e ainda complementam, destacando a importância da uma visão holística e reforçando a necessidade de formar não apenas profissionais, mais sim cidadãos-engenheiros, que saibam analisar o contexto social e os valores que incidem sobre a profissão. O documento ainda elenca a multidisciplinaridade como uma estratégia fundamental no desenvolvimento de profissionais mais completos, que entendam a importância da expressão oral, gráfica e de liderança.


Sobre isso, o parecer CNE/CES 01 (2019) apresenta:

“A formação em Engenharia deve ser vista principalmente como um processo que envolve as pessoas, suas necessidades, suas expectativas, seus comportamentos e que requer empatia, interesse pelo usuário, além da utilização de técnicas que permitam transformar a observação em formulação do problema a ser resolvido, com a aplicação da tecnologia. A busca de soluções técnicas, como parte deste processo, se utiliza do conhecimento técnico da matemática, das ciências, das ciências da engenharia, para que se alcance o resultado que seja tecnicamente viável e desejável para o usuário final.”

Assim, o profissional de engenharia deve saber analisar contextos complexos e acompanhar os avanços da ciência e da tecnologia, desenvolvendo além das competências de caráter geral, as de caráter específico, como o ciclo de vida e o gerenciamento de empreendimentos e produtos, o que habilitaria o profissional para ser um empreendedor, ou um projetista de soluções inovadoras, por exemplo. As áreas de atuação do engenheiro se ampliam com as novas DCNs, pois passam a incluir atividades de capacitação, como treinamento e formação de profissionais da área tecnológica (Resolução CNE/CES 01/2019).


O desenvolvimento concomitante das competências se mostra extremamente importante, o que potencializa a busca, a integração, a criação e a produção do saber durante a evolução do curso. O acompanhamento, a avaliação do conteúdo e as novas estratégias pedagógicas, devem proporcionar ao estudante uma caminhada mais íntegra entre a tecnologia e o contexto social. As atividades que envolvam a parceria entre a academia e outros setores/espaços do conhecimento, são benéficas e necessárias para a difusão do conhecimento, uma vez que, as reflexões e teorizações das situações práticas, ajudam na estruturação da dinâmica do aprendizado (Resolução CNE/CES 01/2019).


As competências devem ser integradas com a exploração de conteúdo múltiplo, para que as situações problemas, reais ou simuladas, sejam pensadas amplamente e resolvidas individualmente ou em grupo, desencadeando o processo do conhecimento.


A resolução de 2002 já estabelecia a necessidade da formulação de currículos articulados com a sociedade e o entorno ao qual a IES se encontra inserida, e com a resolução de 2019, isto fica muito mais evidente, quando é declarada a necessidade dos cursos terem suas peculiaridades, contextualizando a política, a geografia e a institucionalização. Deve existir coerência entre os objetivos do curso, o perfil do egresso e a matriz curricular, prevalecendo os aspectos qualitativos sobre os quantitativos durante a formação deste profissional (Resolução CNE/CES 01/2019).


Efetivamente, um Engenheiro formado nesta nova realidade, deverá estar mais preparado para entender e se posicionar sobre a implicação de cada inovação tecnológica, que precisa ser analisada a partir do impacto que será gerado na sociedade. Questões como a desigualdade social, o nível de emprego, a concentração de renda, entre outros fatores, são fortemente afetados pelo desenvolvimento tecnológico realizado pela engenharia, para o bem e para o mal. Não se trata de demonizar as inovações tecnológicas e nem de considerá-las um fim em si mesmo. O que o Engenheiro deve fazer é se posicionar criticamente sobre cada inovação, avaliando seus impactos, valorizando seus benefícios e mitigando seus danos.


Quanto à uma formação que valorize as competências, os resultados efetivos para a prática profissional são imediatos, especialmente se observarmos, por exemplo, o item III do inciso d) do artigo quarto:

III - conceber, projetar e analisar sistemas, produtos (bens e serviços), componentes ou processos:
a) ser capaz de conceber e projetar soluções criativas, desejáveis e viáveis, técnica e economicamente, nos contextos em que serão aplicadas;
b) projetar e determinar os parâmetros construtivos e operacionais para as soluções de Engenharia;
c) aplicar conceitos de gestão para planejar, supervisionar, elaborar e coordenar projetos e serviços de engenharia;

Os antigos trabalhos de conclusão de curso se estruturam agora como projetos finais de curso, valorizando assim a atividade de projeto, que talvez seja o que tem de mais nobre na atividade do Engenheiro.


A valorização da perspectiva multidisciplinar e transdisciplinar é outro aspecto que também enriquecerá as competências do futuro profissional. Cada vez mais, na sociedade contemporânea, os problemas envolvem duas, três ou mais áreas de conhecimento, exigindo uma compreensão mais ampla acerca dos projetos a serem desenvolvidos. Executar um projeto portuário, por exemplo, exige conhecimentos ambientais relacionados aos materiais que serão utilizados, bem como, possíveis alterações que o empreendimento poderá trazer ao local onde será implantado, conhecimentos econômicos relativos à viabilidade do projeto, logísticos, e até mesmo conhecimentos humanísticos relativos ao público que será beneficiado, o que influenciará nas formas e decisões envolvidas na concepção do projeto.


Certamente, se essas perspectivas de formação do Engenheiro estivessem presentes em outros momentos históricos, quem sabe não teríamos um posicionamento mais claro e assertivo da engenharia. Desde o movimento como “O Petróleo é Nosso” até a descoberta do pré-sal, passando pelo sucateamento de nossa malha ferroviária em favor das rodovias, certamente teríamos uma participação mais ativa dos Engenheiros se eles tivessem uma formação menos cartesiana e mais humanística, pois são evidentes os impactos destes episódios naquilo que, ao fim e ao cabo, acaba sendo o mais importante: a demanda por mais e melhores Engenheiros.

 

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