
Eng. MSc. Profa. Danielle Clerman Bruxel - Engenheira Civil (UFRGS), Mestre em Geotecnia com ênfase em Pavimentação, Doutoranda em Pavimentação pelo PPGCI/UFRGS. Atua profissionalmente em projetos de pavimentação, geotécnicos, gerenciamento e fiscalização de obras de infraestrutura. Atua como Coordenadora de Qualidade e Controle Tecnológico na empresa TÜV Rheinland Ductor e como professora na Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. É membro do grupo da Sergs Mulheres na Engenharia. Diretora e sócia da DClerman Engenharia.
A Presença Feminina nas Obras de Reconstrução do Aeroporto de Porto Alegre
Em maio de 2024, os eventos climáticos ocorridos no Rio Grande do Sul castigaram o Estado levando a uma situação de calamidade, após a falha de diversas estruturas. A necessidade de reconstrução pós-enchente foi o principal norteador dos esforços do governo, da iniciativa privada e da população civil nos meses que se sucederam. E foi diante desse cenário que tive a oportunidade de retornar ao trabalho em infraestrutura aeroportuária, passando a integrar a equipe de fiscalização das obras do aeroporto, na função de controle e gerenciamento de qualidade.
A reconstrução e reabertura do aeroporto foi uma provocação técnica para profissionais de diversas áreas comuns à engenharia. Os desafios dessa obra foram significativos visto que os efeitos da inundação foram severos e que poucos registros, na área técnica, determinavam os procedimentos de avaliação das condições estruturais dos pavimentos. O planejamento das atividades de reconstrução da pista de pouso e decolagem e das diversas taxiways, bem como os projetos e escolha técnica de materiais e métodos, foram amplamente discutidos e estudados pelas equipes de infraestrutura envolvidas nesse projeto.
Questões técnicas desafiadoras, somadas ao curto prazo de execução, devido à necessidade de reabertura das operações do aeroporto, levaram a concessionária a buscar inúmeras alternativas técnicas com foco em qualidade, sustentabilidade e atendimento de prazos.
Ao longo de cinco meses a obra do aeroporto contou com o fornecimento de 140 mil toneladas de concreto asfáltico, produzido a partir de cinco jazidas pétreas diferentes, três usinas de asfalto e 24 horas de produção e operação. Além disso, aspectos quanto à sustentabilidade foram amplamente relevantes, com a reutilização de parte do material fresado bem como a instalação de uma usina dentro do site aeroportuário, com o objetivo de reduzir emissões no transporte dos materiais produzidos. A obra foi entregue no prazo estabelecido, atendendo a padrões de desempenho internacionais. Dessa forma, poderíamos encerrar este relato com a certeza de que as boas práticas de engenharia foram atendidas na obra. No entanto, outro assunto deve ser abordado. A obra de reconstrução do aeroporto de Porto Alegre, foi um marco para a retomada do crescimento e do comércio, mas também foi um exemplo de boas práticas de governança.
MATÉRIA DE CAPA
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PALAVRA DA PRESIDENTE

ARTIGOS

CIVIL
INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS
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FISCALIZAÇÃO



Equipe de Fiscalização da TÜV Rheiland Ductor
A necessidade urgente de profissionais de engenharia passou a ser uma demanda relevante logo após as enchentes. Com foco no atendimento das demandas de fiscalização das obras do aeroporto, a contratação de um time técnico experiente e preparado foi a missão da gerenciadora e fiscalizadora TÜV Rheinland, empresa parceira da concessionária Fraport nas obras de reconstrução. E é neste quesito que observamos práticas positivas, porém pouco usuais absorvidas pela fiscalizadora.
Com um efetivo robusto, a empresa apostou na composição de um time técnico composto por laboratoristas, técnicos, inspetores e engenheiros. Com o apoio da concessionária, entre o total de profissionais alocados no projeto de fiscalização e controle tecnológico, 40% foram de mulheres. Quando se observa especificamente o efetivo de engenheiros da equipe, esse número aumenta para 60% de mulheres engenheiras atuando diretamente nas obras de fiscalização. O exemplo da obra de reconstrução do aeroporto é um marco quanto à criação de oportunidades para que engenheiras passem a dividir o espaço técnico em infraestrutura, que usualmente é masculino.

Equipe de Qualidade: Eng. Danielle Clerman, Eng. Greycy Kazanowski, Eng. Gabriel De Cesaro e Graduanda de engenharia civil Gabriela Almeida
O caso da obra do aeroporto, infelizmente, não é uma realidade de mercado quando se aborda a participação feminina em obras. Embora, muito tenha se avançado na conquista de um maior espaço feminino na área das engenharias, ainda é necessário um longo caminho a ser trilhado para equivalência de oportunidades e cargos. Dentro do segmento de infraestrutura, conhecido como uma área de atividades ditas “pesadas”, menor é a incidência da participação de mulheres em cargos técnicos.
Sabemos que as mulheres desempenham um papel significativo na engenharia contribuindo para o desenvolvimento e a busca de soluções inovadoras. No entanto, ainda há preconceitos e padrões a serem rompidos. Quando apontamos para a presença de mais mulheres em obras de infraestrutura, não se trata apenas de preenchimento de vagas, mas de oferecer as mesmas oportunidades para que juntos, engenheiros e engenheiras, técnicos e técnicas desenvolvam um trabalho de excelência.
Com mais de vinte anos de experiencia em atuação na área de infraestrutura, com foco nos setores rodoviário e aeroportuário, a gerente de projeto e engenheira Diana Azambuja acredita que é papel de mulheres, com maior alcance profissional, mostrar caminhos possíveis para que novas profissionais possam trilhar essa mesma trajetória. Nesse sentido, com apoio do Sicepot e da SLC Máquinas John Deere, Diana lançou um projeto de formação de mulheres operadoras de máquinas pesadas. “Quando olhamos para as obras de infraestrutura, devemos olhar para todo o contexto de oportunidades que esse mercado oferece para as mulheres. Operar escavadeiras, tratores, rolos compactadores e outros equipamentos pesados de terraplenagem são campos de atuação majoritariamente masculinos, mas que, no entanto, não exigem força física alguma, basta habilitação e curso de formação apropriado. Por que não mulheres?” A primeira edição do projeto contou com mais de cem inscritas, das quais 27 concluíram o curso. No mês de outubro ocorrerá a nova edição na cidade de Passo Fundo (RS).
Segundo dados do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), as mulheres representam aproximadamente 20% do total de profissionais da engenharia cadastrados nos 27 Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia (Creas) (Creadf, 2025). Embora este número seja crescente nos últimos anos, ainda apresenta a desproporcionalidade dentro da área.
Salienta-se também que essa realidade é decorrente do menor número de ingressantes mulheres em cursos das áreas das exatas. Diante desse cenário, diferentes universidades têm realizado ações para a retenção e incentivo das ingressantes em cursos de engenharia. Promover conversas e acolhimento, além de ensino de excelência e preparo profissional têm sido foco do grupo de trabalho da Universidade do Vale do Rio dos Sinos. A Escola Politécnica da Unisinos, investe fortemente na promoção de eventos técnicos que divulguem o mercado de trabalho das engenharias, incentivando a troca de experiências profissionais e vivências de mulheres que atuem nestas áreas. O objetivo é apresentar possibilidades e novos caminhos às alunas da Politécnica, contribuindo assim para a redução da evasão delas nos cursos.
Trabalhar com engenharia é entender que essa profissão é um pilar para o progresso e o desenvolvimento. E, ao meu olhar, trabalhar com infraestrutura é construir caminhos para que possamos crescer. Nossas estradas e pavimentos contam histórias e conectam pessoas e, como todos os caminhos, nem sempre são fáceis ou bem pavimentados.
A entrega da obra do aeroporto, dentro do prazo e atendendo a todas as exigências técnicas e de segurança operacional, contribuiu para a certeza de que engenharia é local de mulheres, e o quão necessárias são essas profissionais. Mostra ainda que, quando as oportunidades são dadas, há mulheres suficientes para ocupar esse espaço.
E cabe também a nós, mulheres que exercem a engenharia, contar nossas histórias e trajetórias. O trabalho da equipe da TÜV Rheinland na obra do aeroporto foi conduzido com técnica, mas também com sensibilidade. Abriu caminhos e oportunidades e, quem sabe, poderá inspirar outros tantos profissionais e empresas. Iniciativas como essas contribuem para a construção não apenas de infraestrutura, mas de um futuro mais inclusivo e sustentável para as próximas gerações.
