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Alexandre Eberle Alves

Mindfulness: uma Experiência em Treinamento de Atividade de Alto Risco

INTRODUÇÃO

Em um ambiente profissional que se apresenta competitivo e dinâmico há necessidade de criação de uma cultura na qual exista motivação e abertura para testes e avaliações de novas ferramentas que possam aprimorar os resultados. Segundo Carvalho et al (2011), quanto mais alta for a capacidade para inovar de forma rápida e eficiente, mais haverá transformação de ideias em produtos, serviços e novos processos.

A premissa de inovação passa a ter maior relevância quando o tema estiver relacionado a melhoria da qualidade de vida, saúde e segurança de funcionários e, em especial, quando as ações estiverem alinhadas com a busca por instrumentos que possam produzir a redução de acidentes de trabalho.

Maex (2018) ressalta que “o livro de Jon Kabat-Zinn, Viver a Catástrofe Total, habilmente traduziu conceitos Budistas tradicionais para uma linguagem cotidiana moderna, de modo a torná-los acessíveis ao Ocidente”. Desta forma, uma difusão da prática do mindfulness ou atenção plena, como foi traduzido para o português ganhou um número maior de adeptos no resto do mundo.

No contexto corporativo, Markus e Lisboa (2015, p.1) apresentam que “o construto mindfulness tem recebido grande atenção nas pesquisas, em sua maioria em estudos clínicos e mais recentemente seu impacto no trabalho”. Sendo assim, reforça-se o quão oportuno é o entendimento desta ferramenta no ambiente empresarial e se há correlação da prática com melhores resultados.

Considerando que ter pessoas bem treinadas em seus postos de trabalho tem reflexo direto no desempenho de qualquer companhia, testar a prática de mindfulness no processo de formação de profissionais passa a ter grande relevância no estudo de sua eficácia no processo de desenvolvimento de pessoas.

Especial atenção pode ser dada no caso de desenvolvimento de profissionais que são treinados para exercer atividades fundamentais para a sociedade e com risco a vida. Portanto, é essencial fornecer uma formação que proporcione o entendimento dos quesitos técnicos, bem como e, principalmente, o alinhamento dos colaboradores com as premissas de segurança, prevenção de acidentes e, obviamente, com as necessidades de produtividade da corporação, sendo esta última, uma condição básica de sustentabilidade.

O objetivo geral de trabalho é testar a prática de mindfulness na formação de eletricistas para atuação em rede de distribuição elétrica.

Os objetivos específicos são: aplicar testes psicológicos antes e depois do treinamento, comparar resultados de grupo formado sem e com a realização da prática de mindfulness e, por fim, avaliar os resultados.

Lapa (2018) afirma que há benefícios comprovados da aplicação do mindfulness no mundo corporativo e ressalta que empresas do Ocidente estão promovendo o bem-estar e produtividade dos funcionários com a prática. Reforça, ainda, que o movimento começou em startups no Vale do Silício e apresenta empresas como Aetna, Beiersdorf, Bosch, General Mills, Goldman Sachs, Intel, Royal Dutch Shell, SAP, Target, o Parlamento do Reino Unido e a Câmara dos Representantes dos EUA. Além disso, ressalta ser popular começar o dia de trabalho com meditação em muitas empresas do Vale do Silício, incluindo Apple, Facebook, LinkedIn e Twitter.

Este trabalho está estruturado com os conceitos principais e referências teóricas do tema no capítulo de marco conceitual, na sequência a metodologia de pesquisa aplicada ao trabalho e, posteriormente, os resultados obtidos. Por fim, as considerações finais sobre a pesquisa realizada.

2. MARCO CONCEITUAL

Considerando a necessidade de entendimento teórico do tema antes da aplicação prática, este capítulo propõe o aprofundamento na busca de conhecimento básico do assunto que permita a compreensão das bases do mindfulness

2.1 – Mindfulness

Conforme Lopes, Castro e Neufeld (2012, p.69), mindfulness é a habilidade de estar consciente dos seus pensamentos, emoções, sensações e ações, no momento presente sem julgar ou criticar a si mesmo ou a própria experiência.

A realização da prática de mindfulness ou atenção plena, é atribuída ao aumento de poder de foco, concentração, alívio de estresse entre outros benefícios. (Zenklub, 2018). Assim, verifica-se que, obtido o resultado esperado, o aprimoramento destas habilidades é fundamental para melhoria dos resultados de qualquer profissional do mundo moderno e, em especial, para os que atuam em atividades de perigo iminente a vida, uma vez que as aptidões trabalhadas nos exercícios são excelentes para as formações de profissionais que atuam com elevado risco na realização de suas atividades.

De acordo com Ackerman (2017), Jon Kabat-Zinn é considerado o pai fundador da redução do estresse baseado em mindfulness. A autora reforça que ele fundou a prática na década de 1970 e adotou uma perspectiva moderna baseada na ciência para os princípios budistas tradicionais de atenção plena e meditação, bem como desenvolveu uma abordagem flexível para reduzir o estresse.

Zenklub (2018) reforça também que “apesar do mindfulness ter raízes em crenças espalhadas por todo o mundo – mais fortemente no budismo, mas também no hinduísmo, judaísmo, e cristianismo – não é preciso ser adepto a nenhuma religião para praticar o método”.

Além disso, conforme já citado neste trabalho, “esta forma de meditação tornou-se muito popular entre grandes empresas de tecnologia do Vale do Silício, nos EUA, devido a comprovação da eficácia do aumento da criatividade e inteligência emocional. Já no Reino Unido, a prática meditativa está no sistema público de saúde desde 2009.” (ZENKLUB, 2018).


2.2 – Importância da atenção plena em atividade de risco

Define-se atenção como “tensão de olhar, de ouvir e de ter concentração mental para compreender o que se passa”. (ATENÇÃO, 2021).

Gazzaniga, Ivry e Mangun (2006) referem que a atenção envolve os estímulos sensoriais, como a percepções de estímulos internos e externos, englobando ainda os processos mentais, como somar números mentalmente, por exemplo.

Sternberg (2010) complementa que a atenção consciente permite ao sujeito monitorar sua interação com o ambiente e perceber quão adequada está sua adaptação ao meio, fazendo com que o envolvido possa relacionar o passado – memorizando - com o presente, possibilitando assim a identidade pessoal. Por meio desse monitoramento com o ambiente e essa relação passado-presente, pode também planejar e controlar futuras ações.

Lobo (2020), ressalta que há fatores que podem piorar o estado de atenção do trabalho e, desta forma, diminuir a segurança por desatenção. O autor ressalta também outros fatores como, por exemplo, falta de cuidado, soluções práticas e inseguras para eventuais problemas e principalmente a retirada de equipamentos de proteção em locais proibidos.

Além disso, “para que ocorra essa gestão de erros, dentre outros aspectos, a empresa deve dar uma atenção especial aos apoios instrumentais que ela disponibiliza aos trabalhadores, pois os instrumentos auxiliam a organização das atividades cotidianas na medida em que servem de suportes à atenção e memória”. (SOARES; FILHO, 2015, p. 08). Desta forma, a disponibilização de ferramenta que possibilite a melhoria da capacidade de atenção, conforme se propõe o exercício de atenção plena, está alinhada ao entendimento dos autores citados.

Ressalta-se também, que a segurança do trabalho é baseada na prevenção. Dennis e Draper (1989) rezam que a prevenção pode ser entendida como o ato de prestar atenção aos ambientes físicos, químicos, biológicos, sociais e econômicos com o intuito de reduzir acidentes, doenças ou morte. Além disso, “a prevenção primária em saúde ocupacional compreende uma série de medidas e técnicas que visam eliminar ou reduzir a exposição a riscos para a saúde, no ambiente de trabalho” (GOELZER, 2016, p. 17).

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2.3 – Testes Psicológicos

Segundo Noronha e Vendramini (2003), “os testes psicológicos são instrumentos utilizados na prática do psicólogo e podem fornecer importantes informações para a elaboração de um diagnóstico, quando do processo de avaliação”. Além disso, os testes são aplicados no mundo corporativo para verificação das habilidades para atividades profissionais. Assim, Formiga e Mello (1999), reforçam “que na indústria podem auxiliar a seleção e classificação de pessoal para as funções seja das mais ou menos especializadas favorecendo um melhor ajustamento do homem ao seu trabalho”.

De acordo com o Conselho Federal de Psicologia (CFP), através da resolução nº 002\2003, “os testes psicológicos são instrumentos de avaliação ou mensuração de características psicológicas, constituindo-se um método ou uma técnica de uso privativo do psicólogo”.

A avaliação psicológica é um processo técnico-científico, o qual pode ser realizado de modo individual ou em grupo, de acordo com cada área de aplicação, e que requer metodologias específicas. É uma técnica dinâmica, de caráter explicativo sobre os fenômenos psicológicos e tem por finalidade subsidiar os trabalhos nos diferentes campos de atuação do psicólogo (CFP, 2003).

No mundo corporativo, em especial no que diz respeito a cargos operacionais e que tenham exposição a risco, é comum haver aplicação de testes psicológicos. Os testes que avaliam os mais diferentes tipos de atenção nos trazem resultados quantitativos que são nivelados por tabelas de classificação. Nos casos de cargos que envolvam periculosidade, as empresas adotam diferentes réguas, buscando os profissionais com melhor performance de modo a diminuir riscos cognitivos à segurança.

Neste estudo, se optou pela utilização do Teste de Atenção Alternada (TEALT) com tabela de classificação por critério de Escolaridade. Esta é uma avaliação comumente aplicada na bateria de testes realizados para entrada na carreira de um eletricista.

O TEALT visa mensurar a capacidade de alternar o foco da atenção, ou seja, focar em um momento em um estímulo e em seguida em outro, de acordo com a necessidade. Para o desempenho de uma atividade de risco, uma habilidade excelente, uma vez que permite que o indivíduo possa manter o foco de atenção num estímulo e alterar com outro. Característica de grande importância para profissionais que necessitam estar atentos as condições de contorno que possam gerar um acidente que, muitas vezes, gera impactos graves.

2.4 – Avaliação Comportamental

Existem diferentes critérios para avaliar comportamentos e, com auxílio de balizadores na formação destes profissionais, busca-se uma padronização e qualidade do serviço prestado.

O perfil esperado de um eletricista é de uma pessoa que tenha disciplina e seja cumpridora de normas e procedimentos de segurança. Muitos destes requisitos podem ser avaliados com entrevistas, embora, em algumas situações, estas possam ser subjetivas de acordo com a régua da profissional que estiver executando as perguntas.

Dentro do perfil esperado, são avaliadas competências quantitativas e qualitativas. Um exemplo é o nível de atenção. Embora o indivíduo deseje profundamente atingir o esperado, sua habilidade cognitiva pode não atingir o mínimo esperado. Isto pode ser desenvolvido com treinamentos e técnicas específicas, que pode ter suporte em exercícios de atenção plena.

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Para exemplificar uma rotina de trabalho, os profissionais costumam atuar em duplas, sendo um deles executor da atividade enquanto o outro fica como vigilante guardião da vida do primeiro. No caso do executor, ele deve estar atento a atividade realizada, muitas vezes em altura ou, até mesmo, em espaços confinados. Enquanto o segundo deve estar atento ao cenário em volta, observando, por exemplo, se algum cidadão se aproxima e, também, complementando / reforçando a atenção ao cumprimento de procedimentos do colega executor.

Caso a atenção falhe em qualquer um dos dois casos, o nível de dano da “falha humana” pode envolver perda financeira de estrutura em casos leves, mutilação ou perda de membro ou funções motoras em casos leves e óbito em casos graves. O risco pode ser fatal, reforçando a importância de fornecimento de ferramentas que possam evitar acidentes.

2.5 – Provas Avaliativas

A confirmação da retenção do conhecimento mínimo em uma formação de atividade de risco iminente a vida é fundamental. Em atividades deste tipo, utiliza-se diversas escalas/ níveis de atividades a serem executadas em cada tarefa para, caso uma delas falhe, a outra serve como complemento para evitar que um acidente grave ocorra. Conhecer todas elas e executá-las do modo correto pode ser a diferença entre a vida ou a morte.

Por exemplo, conhecer que para realizar uma atividade no disjuntor de um poste há uma sequência de ações que trabalham em redundância para evitar o acidente. Pode-se confirmar se a rede não está energizada entrando em contato com o centro de operações. Outra possibilidade é realizar o teste da rede com os equipamentos apropriados. Além disso, pode-se utilizar um equipamento de proteção individual como, por exemplo, uma luva específica adequada para aquela voltagem, em caso de descarga. Pode-se também, realizar um aterramento para, caso ocorra uma descarga, a energia seja direcionada para o solo, evitando que atinja o trabalho. E, por fim, existe ainda, em último caso, o resgate e primeiros socorros para acidentado que, em razão da criticidade, precisa ser realizado no tempo certo e de maneira adequada, ou seja, o conhecimento técnico tem importância fundamental para evitar graves consequências.

Ressalta-se que, no caso da formação de eletricistas onde o estudo foi realizado, todos os profissionais passam por testes de seleção e recrutamento e, posteriormente durante a formação, por mensuração da absorção do aprendizado técnico, uma vez que não há possibilidade de não conhecer os procedimentos, riscos e tarefas, bem como comportamentos esperados.

As habilidades práticas também são exercitadas, pois o eletricista passa por atividades que requerem esforço físico e, muitas vezes, executa suas atividades sobre pressão. Reforçando, assim, a necessidade de disponibilizar ferramentas de desenvolvimento que possam aperfeiçoar o desempenho de suas tarefas, melhorando sua atenção as atividades desenvolvidas.

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3. MÉTODOLOGIA

A empresa onde o estudo foi realizado é uma concessionária do serviço público de distribuição de energia elétrica. O volume de formação de profissionais para a área varia em razão de questões estratégicas do negócio, entretanto o volume de profissionais treinados pela empresa é de aproximadamente 200 novos eletricistas por ano.

O treinamento tem 3 meses de duração, totalizando mais de 500 horas de formação. Sendo assim, por se tratar de treinamento longo, possibilita uma boa introdução da prática de mindfulness.

O projeto piloto de avaliação foi realizado em 2 turmas. A primeira, composta por 23 homens, com ensino médio completo e idades entre 20 e 43 anos, foi nomeada de turma 1. Neste grupo, nenhum dos treinandos recebeu qualquer tipo de orientação ou introdução a trabalho de atenção plena. Sendo assim, realizou a formação tradicional de eletricista dentro do cronograma de treinamento. Este critério foi pensado, justamente, para viabilizar a comparação, tendo uma base totalmente isenta na checagem dos resultados obtidos.

A segunda turma, nomeada de turma 2, foco principal do trabalho, composta por 21 alunos, também, todos homens, com ensino médio completo e idade variando de 19 a 45 anos, foi segregada. Embora tenham realizado as mesmas aulas teóricas e práticas juntos, ou seja, passando pelas mesmas experiências e professores, houve uma separação dos grupos em alguns momentos, justamente para a realização das orientações de Mindfulness. Assim, parte do grupo teve orientação de atenção plena. Este subgrupo foi nomeado de turma 2A. A outra parte da turma, para facilitar o entendimento das comparações, foi nomeado de turma 2B. Este grupo realizou a mesma formação, porém não teve nenhuma interação com exercícios de atenção plena. A intenção foi ter esta amostra para comparação com turma 1.

Para realização da orientação da prática de mindfulness, foi contratada empresa especializada em treinamentos corporativos e, após reuniões de alinhamento, decidida a metodologia a ser aplicada. Foram realizados 6 encontros presenciais de 4 horas cada. Em cada encontro era apresentada a orientação sobre como seriam os trabalhos nos dias consecutivos. Nestes momentos, havia a combinação dos exercícios e como seriam enviados os áudios aos alunos até o próximo encontro presencial.

O primeiro encontro foi de apresentação do projeto, explicando o motivo da separação da turma e reforçando que os desempenhos nas atividades de atenção plena não estariam relacionados, de forma nenhuma, a suas avaliações para aprovação ou reprovação no curso de formação.

Visando maior sensibilização do subgrupo (turma 2A), houve uma maior concentração dos encontros presenciais nos primeiros períodos do curso. Desta forma, foram disponibilizados, por meio de ferramentas eletrônicas, como, por exemplo, o WhatsApp, áudios que possibilitassem aos alunos a realização dos exercícios de atenção e foi solicitado que eles realizassem as práticas encaminhadas diariamente.

Durante os encontros presenciais da turma 2A sobre mindfulness, a turma 2B, que não estava recebendo a orientação de atenção plena, era colocado em outras atividades técnicas da formação, seguindo os trabalhos normais, conforme o cronograma tradicional do treinamento. Como o curso é de longa duração, foi possível realizar a formação sem que houvesse descompasso entre os aprendizados técnicos práticos das turmas 2A e 2B.

Dentro da metodologia, importante mencionar que a separação da turma 2 em 2A e 2B foi realizada de forma aleatória.

Conforme embasamento realizado anteriormente, o instrumento psicológico utilizado para mensurar os níveis de atenção dos grupos foi o Teste de Atenção Alternada (TEALT), que foi aplicado durante o processo seletivo (antes do início do curso) e novamente alguns dias antes do término da formação, da mesma forma nos diferentes grupos.

A pesquisa teve abordagem qualitativa na interpretação dos testes psicológicos e quantitativa na busca por traduzir em números os resultados. Quanto a natureza, trata-se de uma pesquisa básica, na tentativa de gerar conhecimento novos, com aplicação de um construto pouco conhecido no mundo corporativo e aplicada no contexto de solução dos acidentes causados por falta de atenção.

Quanto aos objetivos, a pesquisa foi exploratória e nos procedimentos técnicos buscou o formato pesquisa com survey, uma vez que pegou dados e informações de um grupo de pessoas, utilizando testes psicológicos como instrumento de pesquisa.

3.1 Delineamento

A ferramenta psicológica utilizada foi o Teste de Atenção Alternada (TEALT). Através dele é possível mensurar a capacidade que a pessoa possui para alternar o foco da atenção, concentrando-se ora em um estímulo, ora em outro e em curto espaço de tempo.

Existe um tempo determinado de execução total da ferramenta e será considerado o total de marcações para obter a classificação no final. Rueda (2010) disponibiliza no manual da testagem diversas tabelas de classificação, sendo utilizada nesta análise o critério de classificação por escolaridade.

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