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Eng. Agr. Dra. Magnólia A. S da Silva, Eng. Agr. Dr. Carlos Rogério Mauch

Faculdade de Agronomia UFRGS e UFPEL

 

Email: magnólia.silva@ ufrgs.br, crmauch@ufpel.edu.br

As Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC)

As Plantas Alimentícias Não Convencionais são aquelas que possuem uma ou mais partes (e ou derivados destas partes) que podem ser utilizados na alimentação humana, tais como: raízes tuberosas, tubérculos, bulbos, rizomas, cormos, talos, folhas, brotos, flores, frutos e sementes ou ainda látex, resina e goma, ou que são usadas para obtenção de óleos e gorduras alimentícios. Inclui-se neste conceito também as especiarias, substâncias condimentares e aromáticas, assim como plantas que são utilizadas como substitutas do sal, como edulcorantes (adoçantes), amaciantes de carnes, corantes alimentícios e aquelas utilizadas na fabricação de bebidas, tonificantes e infusões (KINUP, LORENZI, 2014).

As Panc (Plantas Alimentícias Não Convencionais) são encontradas com facilidade em diversos lugares como quintais, hortas, jardins e até em calçadas de rua. Podem ser nativas, silvestres, exóticas, cultivadas e, ainda, colonizar áreas degradadas (KINNUP; LORENZI, 2014). Também conhecidas como as espécies vegetais negligenciadas e subutilizadas, são consideradas as partes, as porções e os produtos alimentícios não convencionais de algumas espécies alimentícias consideradas convencionais. Como exemplo podem ser citadas as folhas da beterraba, da batata doce, flores de abóbora. Fazem parte deste grupo, muitas espécies denominadas “daninhas ou espontâneas" com grande importância ecológica e econômica. Além disso, muitas destas espécies, por exemplo, são alimentícias mesmo que atualmente em desuso (ou quase) pela maior parte da população. O mesmo é válido para plantas silvestres, as quais são genericamente chamadas de "mato", as quais, no entanto, são recursos genéticos com usos potenciais inexplorados (KINNUP,2007). No Brasil existem pelo menos três mil espécies conhecidas de PANC e estudos indicam que cerca de 10% da flora seja de plantas alimentícias (KELEN et al., 2015). Além disso, cabe ressaltar a regionalidade destas espécies e por isso, muitas delas já foram comuns no passado fazendo parte da cultura alimentar brasileira. Elas não possuem cadeia produtiva estruturada e são notavelmente rústicas e resilientes (MADEIRA & KINUPP, 2016).

Como espécies resilientes, fontes nutrientes e outros fitoquímicos, um uso mais amplo destas espécies, aumentaria a sustentabilidade dos agrossistemas e a escolha de alimentos nutritivos com um papel estratégico para enfrentar o desafio da segurança nutricional em todo planeta. Neste sentido, avolumam-se artigos científicos que buscam a confirmação de seus benefícios, funcionalidades e sustentabilidade principalmente ligados a ações antioxidantes e anti-inflamatórias, podendo ser consumidas de várias formas: imatura, cozidas ou agroindustrializadas (LIBERATO et al, 2019; SILVA et al, 2022;CORBARI, et al,2019).

Como espécies resilientes, fontes nutrientes e outros fitoquímicos, um uso mais amplo destas espécies, aumentaria a sustentabilidade dos agrossistemas e a escolha de alimentos nutritivos com um papel estratégico para enfrentar o desafio da segurança nutricional em todo planeta. Neste sentido, avolumam-se artigos científicos que buscam a confirmação de seus benefícios, funcionalidades e sustentabilidade principalmente ligados a ações antioxidantes e anti-inflamatórias, podendo ser consumidas de várias formas: imatura, cozidas ou agroindustrializadas (LIBERATO et al, 2019; SILVA et al, 2022;CORBARI, et al,2019).

Dentro desse grande grupo predominam frutas e hortaliças. Essas hortaliças já fizeram parte da cultura alimentar de alguma região do Brasil, mas que caíram em desuso como beldroega, joão-gomes, caruru e serralha, mas se mantem em regiões especificas. Essas espécies exercem influência na culinária e na cultura locais (exemplos: jambu, vinagreira, ora-pro-nóbis e bertalha) e é exatamente por isso que são chamadas também, especialmente em trabalhos de campo, de hortaliças tradicionais (ZACARIAS, et al, 2021).

As Panc podem ser utilizadas como alimentos funcionais /nutracêuticos, pela presença de determinadas substâncias nesses vegetais que são farmacologicamente ativas. Destacam-se pela presença de compostos bioativos, como moléculas com função antioxidante, capazes de inibir a oxidação e, consequentemente, reduzir a concentração de radicais livres no organismo, dentre as quais estão os bioflavonóides, carotenoides, ß-caroteno, catequinas, cumarinas, indóis, ácido elágico, fibras, genisteína, ácidos graxos ômega-3, limoneno, isoflavonas, quinonas, lignanas e sulfito (SILVA et al, 2022).

Estudos agronômicos sobre estas espécies, mesmo que ainda escassos, têm sido desenvolvidos por várias instituições de pesquisa inclusive com publicações específicas (cartilhas e boletins técnicos) e grande número de artigos. Neste sentido, podemos destacar A Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), com várias publicações com orientações técnicas que detalham exigências climáticas e de solo, propagação, cultivo e tratos culturais. Dentre ela enfatizamos as publicações sobre mangarito (Xanthosoma  riedelianum ), capuchinha (Tropeolum majus), taioba (Xanthosoma sagittifolium) (PEDROSA et al, 2012, SANTOS & PEDROSA, 2016; SANTOS et al, 2020; SEDYAMA et al, 2021, SOUZA, et al 2021). As atividades de pesquisa envolvem o reconhecimento das Panc como integrantes da cultura popular, além de destacar seu papel na melhoria da saúde da população e promover a inserção destas nas hortas escolares e o incremento de renda para agricultores familiares.      

Ainda sobre a pesquisa agronômica, a Embrapa Hortaliças desenvolve projetos com foco na conservação de germoplasma de Hortaliças Panc e na avaliação agronômica, caracterização nutricional e no estudo da vida útil de hortaliças não convencionais. A unidade possui Coleção de Germoplasma que conta com mais de 300 acessos e 70 espécies. Na coleção constam diferentes gêneros e espécies como: Colocasia sp. (inhmaes), Dioscorea (caras), Xanthosomas (taiobas), Arracasia (mandioquinha ou batata baroa), dentre outras espécies folhosas como Talinum paniculatum (major gomes) e Portulaca oleracea (beoldroega). Os trabalhos envolvem identificação, caracterização e seleção de materiais mais produtivos, com melhor padrão (aspecto visual ou aparência), uniformidade e sabor, visando o desenvolvimento de cultivares. Além disso, as pesquisas nesta instituição envolvem avaliação de práticas agrícolas com foco na obtenção de sistema produtivo que expresse o potencial das culturas, permitindo a produção em maior escala e beneficiando os agricultores no sentido da diversificação de seus cultivos. Exemplos de propostas de manejo cultural são o plantio adensado com podas sucessivas de ora-pro-nóbis (Pereskia aculeata Mill), a condução em espaldeira de fisális (Physalis spp.), o plantio de muricato (Solanum muricatum) em leiras e em mini parreiras, e o plantio tardio e adensado de mangarito (Xanthosoma riedelianum (Schott) Schott.  (Zacharias et al, 2021).

No Rio Grande do Sul destacam-se os trabalhos desenvolvidos pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com os estudos de Souza (2014), cuja tese tratou de aspectos fitotécnicos de espécies do gênero Pereskia, e de Braga (2017), que também investigou a propagação sexuada na espécie CREM (Tropaeolum pentaphyllum Lam.). Ainda no Estado, a Universidade Federal de Pelotas tem desenvolvido projetos de pesquisa junto ao programa de Pós-Graduação em Sistemas de Produção em Agricultura Familiar com Panc nos municípios de São Lourenço do Sul, Pelotas, Rio Grande e Canguçu (Theis, J. 2019; Magalhães, R. S. C, 2019; Gralha, T. S. 2020 e Echer, R. 2020, Theis, J. et al. 2020; Echer  et al. 2021a; Echer  et al. 2021b). Esses trabalhos indicam uma grande diversidade na ocorrência e uso de Panc, especialmente vinculados a atividades de agricultura familiar nos municípios citados. Atualmente, três projetos estão em pleno desenvolvimento, avaliando fenologia, morfologia, ocorrência no Bioma Pampa e plantas frutíferas nativas caracterizadas como Panc. Em qualquer caso, observa-se um interesse crescente por parte da população neste grupo de plantas, sendo frequente o oferecimento destes produtos especialmente em feiras agro ecológicas da região (Mauch, 2022, Informação pessoal).

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O mercado para Plantas Alimentares Não Convencionais, mais precisamente as hortaliças, tem revelado demanda crescente associado a diversos setores como os de aquisição de sementes e mudas, agricultores rurais e urbanos, restaurantes e instituições públicas.  Contudo, um dos entraves para iniciar a produção comercial dessas espécies é a ausência de sementes e mudas com origem genética, qualidade fitossanitária e variedades mais produtivas. Muito embora existam espécies inscritas e cultivares registradas no Registro Nacional de Cultivares do Mapa como: ora-pro-nóbis (Pereskia aculeata), inhame (Colocasia esculenta), araruta, azedinha (Rumex acetosa), capuchinha (Tropaeolum majus), labe-labe ou feijão-mangalô (Lablab purpureus), nirá (Allium tuberosum), bertalha (Basella alba), jambu (Acmella oleracea), dente-de-leão (Taraxacum officinalis), abóbora-gila (Cucurbita ficifolia), papoula-do-são-francisco ou vinagreira kenaf (Hibiscus cannabinus), moringa (Moringa oleifera) e espinafre d’água (Ipomoea aquatica), ainda não há disponibilidade de sementes ou mudas em quantidade e qualidade para o mercado que avoluma-se. (Zacharias et al, 2021).

O que podemos de fato afirmar é que vieram para ficar e integrar o mercado de espécies hortícolas no País, sendo crescente a busca dos consumidores interessados em incluir hortaliças Panc em seu cardápio, na busca por uma dieta mais saudável e diversificada. Assim, cabe concordarmos com a proposição de ZACHARIAS et al, 2021 que salienta a afinidade destas espécies a modelos de produção de base agroecológica, por dentro outros fatores a sua rusticidade, baixa exigência de insumos e possibilidade de diversificação do agroecossistema.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:

BRAGA, V. B S ACREM (Tropaeolum pentaphyllum Lam.), TROPAEOLACEAE: ASPECTOS BIOLÓGICOS, NUTRICIONAIS E FITOTÉCNICOS.Tese (Doutorado em Fitotecnia) – Faculdade de Agronomia, Universidade Federal do Rio Grande do sul. Porto Alegre, p. 132. 2017

CORBARI, A. L.; DIAS, E.C.F.; TAVARES, L.L.; ZAMPIERI, N. C.S; BENTO,P. B.E.B.; ANDRADE, S. L.;BERNARDI, D. M. Análise da composição nutricional e desenvolvimento de produtos com pesto de panc, talos e folhas. Fag Journal of Health, 2019, Edição Especial, p.36.

ECHER, R. Plantas Alimentícias Não Convencionais, PANC, Reconhecidas e Utilizadas Pelas Famílias de Estudantes da Escola Família Agrícola da Região Sul, EFASUL. 2020. Tese (Doutorado em Sistemas de Produção Agrícola Familiar - Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2020.

ECHER, REGES ; ROGÉRIO MAUCH, CARLOS ; HEIDEN, GUSTAVO ; DORING KRUMREICH, FERNANDA . Saber sobre as Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC) na Agricultura Familiar vinculada à Escola Família Agrícola da Região Sul (EFASUL), Canguçu, RS. Thema (Pelotas), v. 19, p. 635-655, 2021a.

ECHER, REGES ; KRUMREICH, FERNANDA DORING ; ZIMMER, TAILISE BEATRIZ ROLL ; ZAMBIAZI, RUI CARLOS ; HEIDEN, GUSTAVO ; Mauch, Carlos Rogério . Reconhecimento e determinação de compostos de interesse de plantas alimentícias não convencionais provenientes da agricultura familiar de Canguçu, RS. CADERNOS DE CIÊNCIA & TECNOLOGIA, v. 38, p. 26922, 2021b.

GRALHA, T.S. As Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC) a partir do conhecimento da agricultura familiar no município de Rio Grande, RS, um estudo de caso. 2020. Dissertação (Mestrado em Sistemas de Produção Agrícola Familiar - Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2020.

KELEN, M. E. B.; NOUHUYS, I. S. V.; KEHL, L. C.; BRACK.P.; SILVA, D.B. Plantas alimentícias não convencionais (PANCs): hortaliças espontâneas e nativas. ed.1, p.44, UFRGS: Porto Alegre, 2015.

KINUPP, V. F.; LORENZI, H. Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC) no Brasil: guia de identificação, aspectos nutricionais e receitas ilustradas. Instituto Plantarum de Estudos da Flora. São Paulo. 2015.768p.

KINUPP, V.F. Plantas alimentícias não convencionais da região metropolitana de Porto Alegre, RS. 2007. Tese (Doutorado em Agronomia). Faculdade de

Agronomia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/12870. Acesso em: 07 ago. 2022.

LIBERATO, P.S.; LIMA, D.V.T.; SILVA, G.M.B. PANCs - Plantas Alimentícias não Convencionais e seus benefícios nutricionais. Environmental Smoke, 2(2), 102–111.2019.

MADEIRA, N. R.; KINUPP, V. F. Experiências com as plantas alimentícias não convencionais no Brasil. Informe Agropecuário, v. 37, n. 295, p. 7-11, 2016.

MAGALHÃES, R.S.C. Plantas alimentícias não convencionais (PANC): Estudo etnobotânico no contexto da Associação Regional de produtores Agroecológicos da Região Sul - ARPASUL. 2019. Dissertação (Mestrado em Sistemas de Produção Agrícola Familiar - Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2019.

PEDROSA, M. W.MASCARENHAS, M. H; FONSECA,M.C.M; SILVA, A.F; SANTOS, I.C dos; SEDIYAMA, A. N. Hortaliças não convencionais: Saberes e sabores. Belo Horizonte, EPAMIG, 2012. 28p.

SANTOS, I. C. dos; PEDROSA. M, W. Hortaliças não convencionais folhosas. Informe Agropecuário.v.37.n.295. 2016.104p.

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SOUZA, M.R de M; PEDROSA, M.W.; SANTOS, I.C.dos; SOBUE, S.; DONZELES, S.M.L; SILVA, A. F.; FONSECA, M.C. Taioba: orientações técnicas para cultivo cartilha. EPAMIG. maio 2021.16p.

SOUZA, L. F Aspectos fitotécnicos, bromatológicos e componentes bioativos de Pereskia aculeata, Pereskia grandifolia e Anredera cordifolia.Tese (Doutorado em Fitotecnia) – Faculdade de Agronomia, Universidade Federal do Rio Grande do sul. Porto Alegre, p. 113. 2014.

THEIS, J. Estudo etnobotânico de plantas alimentícias não convencionais (PANC): saberes e sabores da agricultura familiar em São Lourenço do Sul, RS. 2019. Dissertação (Mestrado em Sistemas de Produção Agrícola Familiar - Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2019.

ZACHARIAS. A. O, CARVALHO, H. M. G e MADEIRA,  N. R. Hortaliças PANC -Segurança Alimentar e Nicho de Mercado. Guia DE Negócio. Embrapa. Hortaliças. Brasila- DF. 2021. 11p.

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