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Daniel Letti Grazziotin Engenheiro Civil - Perito - CREA-RS 74.697 - Perícias de Engenharia - Consultoria em Manutenção Predial Especializada em Engenharia Diagnóstica: Anomalias Construtivas e Manifestações Patológicas nas Edificações

​Infiltração de Umidade ou Condensação Interna?

​Durante o nosso inverno, ou nos meses mais próximos dele, quando ocorre uma redução significativa das temperaturas, aqui em nossa região, as pessoas têm a necessidade de se protegerem dessa intempérie, ficando mais tempo com as janelas fechadas em suas residências. Nesta estação fria há, também, um aumento bem considerável de reclamações, por parte dos proprietários, de infiltração de umidade nas unidades residenciais.

A primeira pergunta que o engenheiro diagnóstico ou profissional responsável pela manutenção deve fazer é: Por que no verão, praticamente, não há reclamações de infiltração de umidade nas casas e apartamentos e no inverno as “infiltrações” ocorrem com mais intensidade e frequência? A resposta é que nem sempre a umidade que aparece nas paredes internas é proveniente da área externa.

Vejamos alguns conceitos importantes para entendermos adequadamente o que está ocorrendo em alguns empreendimentos imobiliários, em especial nos mais novos e que possuem uma concepção arquitetônica com áreas privativas reduzidas e utilizam materiais de baixa capacidade de isolamento térmico na construção das paredes.

O ar possui uma característica física importante que é denominada de “ponto de saturação”, e ela representa o volume máximo de vapor d’água que ele pode conter a uma determinada temperatura.

Há estudos científicos que demonstram que duas pessoas realizando as suas atividades normais diárias no interior de sua residência como: tomar banho, cozinhar, lavar e secar roupas, dormir etc. geram em torno de 15 litros de água que são emitidos no ar na forma de vapor d’água.

Outro aspecto muito importante é que o ponto de saturação está diretamente relacionado com a umidade “relativa” do ar e com a temperatura ambiente. Vemos que a mesma umidade existente em ambientes com área / volume diferentes altera a umidade “relativa”. Quanto menor a área do ambiente, gerando-se a mesma umidade, tem-se maior umidade relativa do ar, conforme representado na Figura nº 01.

Fonte: Coleman, Graham R.

Mais uma característica física fundamental é que quanto mais quente estiver o ar, maior é o seu potencial para conter vapor d’água em suspensão.

Na nossa atividade profissional diária encontramos, na grande maioria das vezes, duas situações conforme mostrado nas Fotos nº 01 e 02.

Quando há alguma fissura na parede externa, ou outra falha que permita a ocorrência de infiltração de umidade na parede, o resultado visual no lado interno é, quase sempre, como mostrado na Foto nº 01. Os danos são localizados, na face interna, na região da fissura externa e, quando a pintura interna é com tinta acrílica, a umidade provoca, de forma mais intensa, a formação de bolhas, pois ela não consegue passar pelo filme plástico superficial formado pela tinta.

Mas há situações em que não se constata a ocorrência de infiltração de umidade proveniente da área externa e mesmo assim as paredes apresentam umidade e intensa formação de bolor.

Nestes casos, quando há formação de bolor na face interna da parede externa (Foto nº 02), devemos tomar cuidado na análise, pois “na grande maioria das vezes” não há infiltração vinda de fora, mas está ocorrendo a condensação da umidade do ar sobre a face interna da parede externa, a qual fica com a superfície fria, por causa da sua baixa capacidade de isolamento térmico. A situação fica bem caracterizada quando as manchas de umidade ou bolor são generalizadas por toda a área da parede. Esse é o mesmo princípio físico que faz com que a umidade do ar condense sobre a parede externa do copo de vidro, quando servimos uma bebida gelada. Observa-se, no exemplo mostrado (Foto nº 02), que a umidade e a formação de bolor está ocorrendo somente na face interna da parede externa, ou seja, nas demais paredes do dormitório não ocorre o problema. Elas fazem divisa com outras áreas internas da residência e não sofrem a ação das baixas temperaturas externas.

Fonte: Acervo do autor

Fonte: Acervo do autor

Em dias de temperaturas mais baixas, obrigatoriamente necessitamos manter as janelas mais tempo fechadas para nos protegermos do frio. Isso impede a troca de ar, permanecendo o interior da residência com ar quente e úmido. Esse ar, ao tocar a face interna da parede externa ou os vidros das janelas, que sempre estão com a temperatura mais baixa, mais próxima da temperatura externa, condensa formando muita umidade nesses locais e, por isso, as paredes úmidas acabam por formar bolor, fungo extremamente prejudicial à saúde.

Essa última situação está sendo verificada com muita frequência e deve-se, basicamente a alguns fatores que precisam ser destacados: 1) à redução das áreas das residências, em especial dos dormitórios onde as pessoas tem uma permanência prolongada, o que faz aumentar a umidade relativa do ar. 2) A adoção de materiais, na construção das paredes, com isolamento térmico deficiente como, por exemplo, paredes de placas de concreto armado e paredes de blocos de concreto com os furos verticais preenchidos com concreto armado. Esses materiais tem alta condutibilidade térmica e, consequentemente, baixa capacidade de isolamento.

3) O problema ocorre, ainda, em unidades residenciais com grandes áreas e paredes construídas com materiais convencionais (tijolos cerâmicos furados), mas que devido ao desenho arquitetônico do empreendimento quase nunca pegam sol, por isso ficam mais frias que as demais.

Na tentativa de diminuir a condensação de umidade nessas áreas as construtoras, em seus Manuais de Uso, Operação e Manutenção, orientam que o condômino mantenha as janelas abertas para que ocorra a ventilação, troca do ar úmido interno por ar seco externo, com a consequente secagem das paredes molhadas pela condensação. Mas a permanência das janelas abertas, por longos períodos de tempo necessários para secar as paredes, durante o nosso inverno rigoroso caminha contra a função primária das edificações, que é proteger as pessoas das intempéries. Que imóvel é esse que necessita que uma família fique com as janelas, de sua residência, abertas durante várias horas do dia durante o inverno da nossa região. Para uma ventilação normal e renovação do ar, é necessário, mas abrir as janelas por várias horas durante o dia com o objetivo de secar as paredes é, simplesmente, inaceitável. É quase como voltar a morar nas cavernas.

Os Engenheiros Tito Lívio Ferreira Gomide, Marco Antônio Gullo, Jerônimo Cabral P. Fagundes Neto e Stela Marys Della Flora produziram o livro “Inspeção Predial Total” e ensinam que a edificação deve ser projetada de acordo com o local de sua implantação e deve atender às exigências dos usuários:

Em sua estruturação, pressupõe-se que o edifício inserido no meio ambiente e submetido a condições de exposição ou à atmosfera do local de sua implantação deve atender, primordialmente, às exigências dos usuários ao longo de sua vida útil (VU).

Portanto, entende-se que estamos diante de erros grosseiros de projeto, pois há empreendimentos que estão reduzindo a área das unidades, dos locais de permanência prolongada como os dormitórios, em especial, e adotando materiais, na construção das paredes externas, com alta condutibilidade térmica, ou seja, baixa capacidade de isolamento. Esse procedimento deverá ser tecnicamente revisto, com urgência, pois deverão ser adotadas, nestes casos, compensações que aumentem a capacidade isolante das paredes para que as pessoas possam viver em edificações salubres, sem condensação de umidade e sem a consequente formação de bolor. Na grande maioria dos casos, estamos diante de vícios na concepção (projeto) e na construção de paredes sem capacidade de isolar térmica e adequadamente os ambientes internos para evitar a condensação de umidade e a consequente formação de bolor. A “verdadeira engenharia ou arquitetura” não pode aceitar que sejam “copiadas” e adotadas as mesmas soluções técnicas nas edificações implantadas em regiões com climas diferentes, ou seja, é função da engenharia/arquitetura implantar soluções adequadas para cada região, pois colocar no mercado unidades residenciais que exijam que os moradores permaneçam com as janelas abertas por várias horas do dia durante o inverno rigoroso é desumano.

Com base no exposto, especialmente as edificações destinadas ao público de baixa renda, ou seja, que combinam ambientes de permanência prolongada e áreas reduzidas devem, por uma questão de saúde pública, receber atenção especial, quanto ao isolamento térmico, na especificação dos materiais das paredes externas e vidros das esquadrias.

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